Sempre tive curiosidade em saber quem de fato são os ciganos. Cresci ouvindo que este povo era perigoso, que trapaceavam, roubavam… Meus pais sempre alertavam: “Cuidado com a ciganada, eles estão por aí.”
Apesar do medo, passava próximo dos acampamentos, mas nunca tive coragem e nem oportunidade de chegar até eles. O tempo passou e a curiosidade permaneceu. Até que descobri o trabalho que a Igreja desenvolve junto a esse povo. Fui logo buscar saber como era isso, e em pouco tempo fui convidado a ser agente da Pastoral dos Nômades. Aceitando o convite, passei a freqüentar assiduamente os acampamentos e residências dos ciganos da região de Sorocaba SP.
Entre tantas lições que recebi deste povo, uma gostaria de destacar. Certa vez eu e a professora Ignez Carneiro, estávamos acampados com um grupo. Saímos para fazer compras.
Junto conosco foi uma ciganinha, de aproximadamente 08 anos de idade.Ao retornar ao acampamento, compramos um suco contendo 200 ml para cada um. Quando já estava avistando as barracas, observei que a ciganinha não havia terminado de beber. Ainda restava a metade. Apressei-me em alertá-la, que consumisse o quanto antes, pois no acampamento havia outras crianças e que não tínhamos comprado suco para todas. Para minha surpresa, serenamente ela respondeu:“É justamente para eles que estou guardando. Eles também devem provar!” Fiquei calado imaginando um possível tumulto. Afinal eram 100 ml de suco, para mais 10 crianças. No final, todos experimentaram, respeitando a próxima criança que esperava ansiosamente, para apenas molhar a boca com aquele restante. Esta cena me fez refletir: Como a sociedade seria diferente, se todos pensassem como aqueles ciganinhos!
A princípio imaginava que minha função como agente seria de instruí-los, catequizá-los. Porém descobri que muito mais do que ensinar é aprender com eles. Quanta fé, quanta sabedoria, quanto respeito pelos idosos, pelas crianças… Comprometidos com o próximo,desapegados de bens materiais, companheiros para todas as horas.
Compreendi que Deus, através da minha curiosidade levou-me a descobrir outra realidade. E o melhor foi perceber que não estou sozinho. Na pastoral conheci pessoas dedicadas a mostrar para a sociedade que o povo nômade tem seu valor e não podem ficar à margem. Estamos envolvidos no mesmo ideal: Buscar ser presença viva de Jesus no meio deste povo. E unidos podemos romper barreiras somando forças para que o Evangelho continue sendo anunciado a todos os confins da Terra.
Eliéser Queiroz – Iperó SP
Foto: http://www.vurdon.it/